Alerta
Portaria PGFN/MF nº 2.044/2024: novas regras sobre oferecimento e aceitação de seguro garantia no âmbito da PGFN
Foi publicada no último dia 31 de dezembro a Portaria PGFN/MF nº 2.044/2024 (“Portaria”), regulamentando o oferecimento e aceitação do seguro garantia no âmbito da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”), em substituição à Portaria PGFN nº 164/2014 (“Portaria 164/2014”). A Portaria foi resultado de análise de comentários enviados por meio de consulta pública publicada pela PGFN por meio do Edital nº 13/2024 em 13 de setembro de 2024.
Além de rever os dispositivos da Portaria 164/2014 sobre o oferecimento e aceitação do seguro garantia judicial com relação a débitos inscritos em dívida ativa e/ou originários do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (“FGTS”), a Portaria atualiza os modelos de apólice padrão de “seguro garantia para execução fiscal” e “seguro garantia para negociação administrativa”, denominação utilizada para a garantia de débitos objeto de parcelamento ou acordo.
Destacamos abaixo as principais novidades da Portaria:
Negociação administrativa
Em substituição ao termo “parcelamento administrativo fiscal”, a Portaria define “negociação administrativa” como a forma de regularização de débitos inscritos em dívida ativa da União (“DAU”) ou do FGTS por meio de parcelamento, acordo de transação ou negócio jurídico processual (art. 2º, IV). Nessa modalidade, o valor do seguro deverá corresponder ao total do débito consolidado a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice, sem considerar eventuais descontos legais previstos na negociação.
Momento da oferta do seguro
(i) Na execução fiscal, se os débitos inscritos em DAU estiverem ajuizados; ou (ii) no REGULARIZE da PGFN, conforme art. 11 da Portaria PGFN nº 33/2017, no caso de débitos em vias de serem inscritos em dívida ativa, não ajuizados ou quando referentes a seguro garantia para negociação administrativa (art. 1º, §2º), caso em que o valor do seguro deverá corresponder ao total do débito a ser garantido, com todos os acréscimos legais incidentes até a data da emissão da apólice, inclusive do encargo legal exigível por ocasião do ajuizamento da execução fiscal.
Objeto principal
A Portaria define como objeto principal das apólices, além dos débitos inscritos em DAU ou do FGTS que, por serem títulos executivos extrajudiciais, poderiam ser cobrados administrativa e judicialmente pela PGFN, também os débitos em vias de serem inscritos, quando houver intenção de discuti-los na esfera judicial após o encerramento do processo administrativo por julgamento definitivo ou por renúncia às discussões na forma do art. 38, parágrafo único, da Lei nº 6.830/1980 (“LEF”) (art. 2º, XVI).
Cosseguro
A Portaria traz de forma expressa a possibilidade de cosseguro, devendo a apólice, nesse caso, trazer informação expressa sobre (i) a seguradora líder e suas atribuições, (ii) a inexistência de responsabilidade solidária entre as cosseguradoras, salvo disposição em contrário no contrato de cosseguro, e (iii) o nome, CNPJ e limite de responsabilidade de cada uma das cosseguradoras por extenso.
Renovação automática
A seguradora deverá garantir que a efetivação da renovação ocorra antes do término do prazo de vigência da apólice (art. 3º, § 6º) e poderá se manifestar pela não renovação do seguro se não houver mais risco a ser coberto ou se houver substituição por nova garantia aceita pela PGFN (art. 3º, § 7º). O tomador, todavia, não poderá se opor à manutenção do seguro se não ocorrer substituição da apólice (art. 3º, § 8º). O tomador ou a seguradora deverão apresentar o documento comprobatório da renovação do seguro garantia ao segurado antes do término da vigência da apólice (item 7.5. das minutas de condições contratuais).
Caracterização do sinistro
No seguro garantia para execução fiscal, ao contrário do que prevê a Portaria 164/2014 no sentido de que o sinistro restará caracterizado quando do não pagamento pelo tomador de valor determinado pelo juiz independentemente da existência de decisão transitada em julgado, a Portaria prevê que o sinistro restará caracterizado somente se verificado o inadimplemento do tomador com relação ao pagamento do valor garantido no prazo de até 15 (quinze) dias após a ciência do trânsito em julgado da decisão de mérito (item 8.11 das minutas de condições contratuais). No caso de seguro garantia para execução fiscal apresentado antecipadamente, com o não pagamento, pelo tomador, do valor garantido em até 15 dias após o decurso do prazo para oferecimento dos embargos à execução sem o correspondente ajuizamento de ação judicial para discussão do débito, caracteriza-se o sinistro (item 8.1.4. das minutas das condições contratuais das apólices). A indenização será proporcional à parte que o tomador restou vencido em caso de decisão com julgamento parcial (art. 12, §3º).
Vigência mínima de 5 anos
A vigência mínima do seguro garantia passa a ser de 5 anos para os casos de garantia de execução fiscal, e não mais 2 anos conforme previsto na Portaria 164/2014, “devendo a seguradora garantir a manutenção da cobertura enquanto houver risco a ser coberto, independentemente de solicitação do tomador, mediante renovações sucessivas da apólice que devem manter todas as cláusulas originais, com alterações limitadas à atualização do valor da garantia e ao prazo de vigência, sem prejuízo de eventuais alterações nas condições comerciais restritas à relação entre a seguradora e o tomador”, conforme também estabelece a Circular Susep nº 662/2022. Para os casos de garantia de negociação administrativa, a vigência da apólice deve corresponder ao prazo de duração da negociação, podendo a PGFN aceitar apólices com prazo de vigência inferior, conforme atualmente já previsto na Portaria 164/2014 (art. 3º, VI), desde que observado o disposto no art. 3º, VI, “a”, da Portaria.
Vedação de franquia
A Portaria veda expressamente a previsão de franquia, participação obrigatória ou prazo de carência nas apólices de seguro garantia (art. 3º, XIII).
Verificação de apontamentos previstos na Circular Susep nº 691/2023
A aceitação ou renovação do seguro garantia ficará impedida se verificado, por meio de certidão emitida pela Superintendência de Seguros Privados (“Susep”), cuja apresentação é obrigatória, que a seguradora emitente da apólice (ou eventual cosseguradora): (i) possui Patrimônio Líquido Ajustado (PLA) inferior ao Capital Mínimo Requerido (CMR); (ii) possui montante de ativos garantidores inferior à necessidade de cobertura das provisões técnicas; (iii) apresenta medida prudencial preventiva e/ou medida cautelar em vigor descumprida; (iv) apresenta instauração de Fiscalização Especial, decorrente do previsto no art. 89 do Decreto-Lei nº 73/66; e/ou (v) possui instaurado regime de Direção Fiscal ou de Intervenção (incisos I, II, XI, XII e XIII, respectivamente, do art. 5º da Circular Susep nº 691/2023). A renovação, contudo, será possível nas hipóteses (i) e (ii) acima, se existir Plano de Regularização de Solvência – PRS ou Plano de Regularização de Suficiência de Cobertura – PRC em andamento. Se verificada a ocorrência de qualquer uma das situações acima após a aceitação do seguro, o tomador deverá providenciar perante a seguradora a regularização das situações que impedem a renovação do seguro garantia, ou apresentar nova garantia, suficiente e idônea dentro do prazo de vigência da apólice, sob pena de caracterização de sinistro (art. 6º).
Substituição de bem em arresto e/ou penhora
O seguro garantia para a execução fiscal somente poderá ser aceito se sua apresentação ocorrer antes do depósito ou da efetivação da constrição em dinheiro decorrente de penhora, arresto ou outra medida judicial. Contudo, será possível a substituição da garantia por seguro, exceto se já houver depósito ou efetivação da constrição em dinheiro, sendo que, no caso de débitos ajuizados garantidos por arresto ou penhora com leilão já designado ou com alienação por iniciativa particular já autorizada, a substituição dependerá da aceitação pela PGFN (art. 7º).
Expectativa de sinistro
Para os seguros garantia na modalidade de execução fiscal, a Portaria reforça que a caracterização do sinistro ocorre de forma imediata, não se aplicando a expectativa de sinistro. Para os seguros na modalidade de negociação administrativa, com o objetivo de registrar a comunicação da expectativa de sinistro, configurada pelo não pagamento de parcela da dívida negociada, a PGFN divulgará mensalmente a relação de devedores com parcela em atraso (art. 10º).
Prazo para solicitação de documentação complementar pela seguradora
A seguradora poderá, em até 15 dias do recebimento da comunicação do sinistro, solicitar documentação complementar à PGFN, que também terá 15 dias para retorno, suspendendo-se o prazo para pagamento de indenização, voltando a correr a partir do primeiro dia útil subsequente àquele em que foram prestadas as informações (art. 14, §2º).
Nova garantia após sinistro
A Portaria ressalta, ainda, a impossibilidade de apresentação de nova apólice de seguro garantia para o mesmo débito, uma vez caracterizado o sinistro, ainda que com data retroativa (art. 13).
Inadimplemento da seguradora
Caso a seguradora/cosseguradora não realize o pagamento da indenização do seguro, a Portaria prevê expressamente o dever da PGFN de (i) em caso de débitos não ajuizados, incluir a seguradora como corresponsável dos débitos inscritos e promover o ajuizamento da execução fiscal contra o tomador do seguro e a seguradora e, (ii) em caso de débitos ajuizados, incluir a seguradora como corresponsável dos débitos inscritos e requerer ao juízo a inclusão da seguradora no polo passivo da execução fiscal, além de (iii) praticar todos os atos de cobrança em face da seguradora e do tomador (tais como protesto extrajudicial, comunicação aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres, encaminhar representação à Receita Federal do Brasil para exclusão de benefícios e/ou incentivos fiscais, entre outros), bem como (iv) comunicar o fato à Coordenação-Geral de Estratégias de Recuperação de Créditos da Procuradoria-Geral Adjunta da DAU e do FGTS da PGFN. Ainda, não realizado o pagamento integral do débito pela seguradora, haverá sua inclusão em lista restritiva, elaborada pela PGFN, o que impede a aceitação de novas apólices de seguro garantia da mesma seguradora pelo prazo de 180 dias e enquanto pendente a satisfação do débito (§3º do art. 14).
Proposta
A seguradora terá 25 dias para se manifestar sobre a aceitação ou recusa da proposta, já em consonância com o Marco Legal de Seguros (Lei nº 15.040/2024) (item 5.2. das minutas de condições contratuais das apólices).
Prêmio adicional
O tomador também será responsável por eventual prêmio adicional decorrente de alterações na apólice ou atualização de valores (itens 5.3 das minutas de condições contratuais).
Aceitação de seguro em valor inferior ao total de débitos
A Portaria autoriza a aceitação de seguro em valor inferior ao total de débitos, todavia, em negociação administrativa, é necessária a autorização expressa em acordo de transação ou negócio jurídico processual celebrado. A aceitação do seguro em valor inferior ao total de débitos não permitirá a emissão de certidão de regularidade fiscal e não impedirá a adoção de providências para a cobrança da dívida, como a inscrição do nome do devedor no CADIN, restrições estas que não se aplicarão no caso de existirem garantias complementares que, em conjunto, assegurem integralmente os valores devidos.
Ressalte-se, ainda, que foi mantida a dispensa expressa de acréscimo de 30% (trinta) por cento do valor do débito previsto nos art. 835, §2º, e 848, parágrafo único, do CPC (art. 3º, § 3º, da Portaria), conforme já estabelecia a Portaria 164/2014.
Vale ressaltar que as disposições da Portaria sobre a necessidade de trânsito em julgado da decisão judicial para a execução do seguro garantia estão em linha com o recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nesse sentido e com a inclusão do §7º no art. 9º da LEF, promovida pelo artigo 5º da Lei nº 14.689/2023, que garantem segurança jurídica às seguradoras, o que, consequentemente, reflete em aumento do apetite para esse risco e na diminuição dos valores de prêmios, facilitando a contratação dessa modalidade de garantia.
Além disso, os dois modelos de condições contratuais têm como intuito uniformizar as condições das garantias ofertadas no âmbito da PGFN, conferindo maior celeridade no oferecimento e na aceitação da garantia, reduzindo impactos na verificação da regularidade fiscal dos contribuintes em fase de (ou em vias de) cobrança judicial.
As disposições da Portaria serão aplicadas aos seguros e aos pedidos de renovação de apólice pendentes de análise na data de sua entrada em vigor. A Portaria entrará em vigor em 60 dias após a data da sua publicação, que ocorreu em 31 de dezembro de 2024.
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