Alerta
Congresso rejeita vetos importantes na Lei do voto de qualidade no CARF
O Congresso Nacional rejeitou vetos do Presidente da República sobre duas importantes alterações que haviam sido incluídas no projeto que acabou convertido na Lei 14.689/2023 (voto de qualidade no CARF): (i) a proibição da liquidação antecipada de fianças bancárias e seguros apresentados em execuções fiscais e (ii) o cancelamento de multas que ultrapassem 100% do tributo apurado.
Proibição da liquidação antecipada de fianças bancárias e seguros
No passado recente, ganhou força a tese de que garantias para o pagamento de tributos cuja cobrança era contestada pelo contribuinte poderiam ser executadas de forma antecipada, especialmente nos casos em que o contribuinte recebe uma decisão desfavorável na primeira instância. Nestes casos, o contribuinte se via obrigado a desembolsar o valor que ainda estava em discussão para evitar que a garantia fosse executada.
A Jurisprudência chegou a parecer consolidada, com decisões a favor da tese do Fisco nas duas turmas do STJ que decidem casos tributários, bem como em diversos tribunais de segunda instância (como, por exemplo, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região – “TRF3”, que julga casos de contribuintes paulistas).
Já havia, contudo, sinais de mudança de cenário, com algumas recentes decisões contrárias à execução antecipada no TRF3 e movimentos no STJ para rediscutir a posição da corte (no AREsp 2.310.912, a 1ª Turma está empatada em 2 votos a favor de manter o entendimento a favor do Fisco e 2 votos a favor de rejeitar a execução antecipada, aguardando o voto desempate do Min. Benedito Gonçalves).
Com a rejeição do veto do Presidente neste tema, a Lei de Execuções Fiscais passará a prever que, para as modalidades de fiança bancária e seguro¹, a liquidação da garantia só poderá ocorrer após o trânsito em julgado da decisão de mérito desfavorável ao contribuinte. Por se tratar de regra de natureza processual, parece-nos que esta novidade deve ser aplicada em todos os processos em andamento. Tendo em vista que estas são as modalidades mais recorrentes de garantia, a tese do Fisco para executar garantias de forma antecipada deve perder relevância nos tribunais.
Cancelamento de multas que ultrapassem 100% do tributo apurado
Outra disposição que havia sido vetada foi a que cancelava multas em autuações fiscais que ultrapassassem 100% do valor do tributo apurado. Neste ponto, a Lei faz referência a decisões do STF que limitam multas tributárias ao valor do tributo apurado, e o veto se deu em razão de incertezas quanto a aplicação de tais decisões. Por exemplo, a pendência do julgamento do Tema 863, no qual o STF vai analisar se as multas poderiam ultrapassar o valor do tributo em casos de sonegação, fraude ou conluio. Ademais, a própria Lei 14.689/2023 continuou a prever multa em patamar superior a 100% (nos casos de reincidência em sonegação, fraude ou conluio).
Nada obstante estas discussões, o Congresso rejeitou o veto e a Lei 14.689/2023 passará a prever que ficam canceladas as multas em autuações fiscais que excedam a 100% (cem por cento) do valor do tributo apurado. O cancelamento previsto se aplica de forma ampla, sendo previsto para (i) casos que ainda estão na esfera administrativa (não inscritos em dívida ativa); (ii) casos que estão na (ou a caminho da) esfera judicial (inscritos em dívida ativa); e (iii) até mesmo para casos que já foram total ou parcialmente pagos pelo contribuinte, desde que ainda não esteja prescrito o direito de restituição/ressarcimento do valor pago.
A rejeição do veto, que se fundamentava justamente na incerteza do alcance do limite de 100% aos casos de sonegação, fraude ou conluio, parece afastar dúvidas de que o objetivo do Congresso Nacional era de que os dispositivos em discussão devam ser aplicados inclusive nestes casos.
Por outro lado, apesar de as decisões do STF a respeito do assunto não serem específicas para tributos federais, a redação adotada pelo Congresso parece limitar o alcance do dispositivo a cobranças federais, muito embora haja também muitos casos de multas que extrapolam 100% do tributo apurado nas esferas estaduais e municipais (para os quais, em uma visão lógica/sistemática, o cancelamento também deveria se aplicar).
Próximos passos
A Constituição determina que a rejeição dos vetos seja informada ao Presidente da República, que terá prazo de 48 horas para promulgar os dispositivos vetados. Caso o Presidente não promulgue os dispositivos cujo veto foi rejeitado no prazo, os Presidentes do Senado ou da Câmara poderão fazê-lo.
¹Vale lembrar que a Lei de Execuções Fiscais já prevê que o depósito em dinheiro só pode ser liquidado (convertido em pagamento do Fisco ou levantado pelo contribuinte) após o trânsito em julgado. Além disso, em previsão da Lei 14.689/2023 que não tinha sido vetada pelo Presidente, a execução antecipada de garantia já havia sido proibida para casos em que o contribuinte havia sido derrotado nas esferas administrativas pelo voto de qualidade.
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